Externar sentimentos apenas no mundo virtual não é saudável para as relações afetivas

Em frente a uma tela de computador ou com um celular em mãos, alguém sorri, ri, solta uma gostosa gargalhada. Há também quem se indigna, lamenta, chora. Ao contemplar uma variedade de apelos visuais, auditivos e táteis, a cabeça viaja e o coração pulsa com vontade. Nas redes sociais, textos manifestam afeto, externam descontentamento, cobram atenção, demonstram raiva.  Mas… e no mundo real?  Será que as emoções – boas ou ruins – afloram com a mesma intensidade? Ou a capacidade de demonstrar o que pensamos e sentimos tem se restringido ao universo virtual?

Usar as redes sociais para traduzir em palavras nossos pensamentos e sentimentos não é um problema. O perigo começa a rondar quando elas se tornam a única válvula de escape, quando postar frases açucaradas ou indiretas se torna a única forma de extravasar amor ou ressentimento, por exemplo. Não é saudável para as relações afetivas que o bom e velho momento “olhos nos olhos” entre em extinção. É claro que nem sempre teremos coragem de falar para alguém tudo que sentimos, mas essa deve ser uma busca constante da nossa parte. Aos poucos, a maturidade vai nos concedendo a capacidade de conseguir dizer o sentimento certo para a pessoa certa, sem a necessidade de promover uma sessão carapuça.

Basta um passeio pelo Facebook para constatar o fenômeno. Há postagens bem chulas, inclusive, com vocabulário que inclui palavrões. Para piorar, a pessoa faz questão de grafar em maiúsculas, talvez para que não restem dúvidas de que ela está esbravejando. Aí chovem  comentários de quem apoia a confusão. Ou seja: a hastag  #falomesmo ganha força, como se lavar roupa suja em público merecesse aplausos. Mas nem só de barraco vive o homem. Também há quem prefira a rede social ao divã e resolva chorar as pitangas em textões sem parágrafos e sem vírgulas. Aliás, quem se lembra de parágrafos quando se está desacreditado da espécie humana?  Frases com “nunca mais vou acreditar em ninguém” ou “é bom pra eu aprender a não ser tonto” são postadas soltas, sem contexto, com no máximo um “se sentindo decepcionado”.

Mas é claro que o amor também está no ar. Ou na rede, nesse caso. Versos românticos, fotos fofas de jantares e viagens, declarações nos aniversários de namoro, mensagens emocionadas nas bodas de casamento. Tudo isso tem muito valor e até deixa o mundo virtual, geralmente abarrotado de imagens chocantes, mais leve. Todavia, é preciso pensar em dois aspectos: se  a postagem cheia de emoticons de corações corresponde mesmo à realidade e se todo esse afeto também é externado nos encontros a sós, quando não há testemunhas para curtir o momento.

E ter a necessidade de mostrar para o mundo por meio das redes sociais que se está muito bem pode não ser uma escolha acertada.  Esse desejo de provar para o outro que as relações afetivas estão equilibradas quando o casamento está mal das pernas ou quando o relacionamento com o filho está conturbado faz da pessoa refém de si mesma. Ela começa a viver em função de construir um personagem e, quando percebe, não reconhece a própria história na sua linha do tempo virtual. São muitas fotos sorrindo e poucos sorrisos ao vivo e em cores.  São muitos textos bem escritos e nenhuma declaração dita ao pé do ouvido de quem se ama.

Fotos, vídeos e textos podem ser formas eficazes de traduzir sentimentos,  mas ao vivo e em cores sempre será melhor. Dizer o que precisa ser dito a quem precisa ouvir. Sem rodeios, sem indiretas, sem sessão carapuça. Sem necessidade de plateia.

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